O ator australiano
que interpreta o super-herói Wolverine há 13 anos diz que usa poucos dublês e
ganha de seis a oito quilos de músculos antes de cada filme
HUGH
JACKMAN
“Tenho
medo de me machucar”
RECORDE
Hugh Jackman interpreta Wolverine pela sexta vez: cachê de US$ 20 milhões
Ao
contrário de seu conterrâneo Russell Crowe, conhecido pelo temperamento
explosivo na relação com as pessoas, o australiano Hugh Jackman, 44 anos, é
tratado em Hollywood como “Mr. Nice Guy” (Senhor Simpatia). Isso acontece mesmo
tendo adquirido notoriedade como um dos personagens mais estourados dos
quadrinhos, o mutante Wolverine, que ele vive pela sexta vez batendo o recorde
de ator que mais interpretou um papel de HQ nas telas. Foi graças ao
super-herói dotado de garras de aço e espessa costeleta, cuja nova aventura
estreia na sexta-feira 26, que Jackman ingressou no seleto clube dos atores com
cachê na casa dos US$ 20 milhões. O título de “mutante mais sexy do cinema”
ainda veio de bônus, por estar sempre exibindo o tórax esculpido. “Não é
brincadeira ter de ganhar entre seis e oito quilos de músculos antes das
filmagens”, conta o astro. Criado apenas pelo pai, já que sua mãe deixou a
família quando ele tinha 8 anos de idade, Jackman valoriza bastante a
convivência com os filhos. Os dois – Oscar, de 12 anos, e Ava, de 7 anos – são
adotados. Ex-apresentador do Oscar, que comandou em 2009, ele testou o prazer
de estar entre os concorrentes este ano pelo papel do rebelde Jean Valjean de
“Os Miseráveis”. A indicação abriu caminho para atuações mais sérias, mas
Jackman gosta de trabalhar mirando o público adolescente: “Na verdade, sou uma
criança presa em corpo de adulto”. A seguir, os principais trechos da
entrevista concedida com exclusividade à ISTOÉ em Londres, na Inglaterra.
"Não consigo ser grosseiro quando me pedem autógrafo.
Minha vida parece férias se comparada à de Brad Pitt "
Minha vida parece férias se comparada à de Brad Pitt "
“Russell Crowe indicou o meu nome quando
recusou o papel de Wolverine. Sem esse
empurrãozinho certamente não estaria aqui hoje"
Fotos:
divulgação
ISTOÉ –
Após uma vida sem grandes
luxos, o sr. é hoje dono de um cachê de US$ 20 milhões. Isso mudou a sua
relação com o dinheiro?
Hugh
Jackman –
Não me envergonho de ganhar bastante
pelo meu trabalho e faço tudo para merecê-lo. Dinheiro bom é aquele que vem do
nosso esforço, não o dinheiro dado.
ISTOÉ –
Hugh
Jackman –
Sim. Não consigo entender como o meu
pai, que era contador, criou crianças sozinho. Nossas férias se resumiam a
acampar na praia, com seis pessoas numa barraca. Ele cozinhava para toda a
família num fogãozinho a gás e, no resto do tempo, tinha de apartar as brigas
dos filhos. Aprendi com o meu pai o que é verdadeiramente ser uma família.
Como faz para passar esses
valores aos seus filhos?
Hugh
Jackman –
Procuro levá-los a lugares menos
favorecidos do planeta, como o Camboja e a Etiópia. Isso é fundamental para que
entendam o quanto são privilegiados pela vida que têm. Quando era criança, não
tive o que posso dar a eles.
Algum deles já demonstra interesse
em seguir os passos do pai?
Hugh
Jackman –
Oscar pediu para fazer figuração em “Austrália”, mas detestou a experiência apesar dos 320 dólares australianos que ganhou pela sua participação. Ele trabalhou durante quatro dias numa cena de travessia, em que caminhava no meio de uma multidão, sob um calor de mais de 30 graus. Sua atuação se limitava a andar para lá e para cá. Ao final, ele me disse: “Pai, você tem o trabalho mais chato do mundo”.
ISTOÉ –
Já são 13 anos interpretando
Wolverine. Como explica essa longevidade no papel?
Hugh
Jackman –
Não sei como me deixaram ir tão longe. O problema é que, a cada novo filme, tenho mais medo de me machucar nas cenas de ação.
ISTOÉ –
Mesmo com toda a sua forma
física, já começa a se sentir limitado pela idade?
Sim, principalmente agora que já
passei dos 40 anos. Nessa última filmagem eu quase quebrei meu pescoço. A cena
se passava em um trem em alta velocidade. Eu tive de colocar a cabeça para fora
da janela e o meu pescoço ficou preso. O acidente me obrigou a encerrar o dia
mais cedo. Minha esposa (a atriz Deborra-Lee Furness) olhou para mim e disse:
“O que está fazendo? Chega de brincar no pátio da escola. Você não é
invencível”.
ISTOÉ –
Não seria o caso de recorrer
mais a dublês?
Hugh
Jackman –
Eu uso dublê só nas cenas
extremamente perigosas. Jim (o diretor James Mangold) acha que a ação é uma
extensão da personalidade de Wolverine. Por isso, sempre que possível, prefere
que eu dispense o dublê.
ISTOÉ –
Esse aspecto físico do
personagem é o lado mais pesado de sua atuação?
Claro. Cenas de ação, incluindo as de
luta, sempre me deixam com fortes dores no dia seguinte. O treinamento a que me
submeto antes de rodar também acaba comigo. Não é fácil acordar às quatro horas
da manhã para se exercitar. Comer peito de frango sete vezes por dia é outra
coisa que me deixa louco.
ISTOÉ –
Seu apelido em Hollywood é Mr.
Nice Guy (Senhor Simpatia). Não é uma contradição com o lado soturno e até
explosivo do personagem?
Hugh
Jackman –
Eu entendo de Wolverine como ninguém.
Desde criança, aprendi a controlar a raiva. Como sou caçula numa família de
cinco irmãos, cresci com os mais velhos sempre implicando comigo. Imagina como
desejei ter garras de aço para poder acabar com eles.
ISTOÉ –
De onde vem a fama de
bonzinho?
Hugh
Jackman –
Acho que pelo fato de meu pai ter me ensinado a tratar todas as pessoas com respeito. Não vejo motivo para fazer o contrário. É mais fácil ser educado do que ser idiota. Essa é a minha natureza.
ISTOÉ –
Quando os paparazzi o
perseguem, registram sempre um pai de família exemplar, brincando com os
filhos. Gosta dessa imagem?
Meus dias em família não são tão
perfeitos, ainda que as fotos deem essa impressão. Na verdade, sou uma criança
presa em corpo de adulto. Adoro ser pai justamente por me dar o que preciso:
licença para brincar o tempo todo.
ISTOÉ –
Esse assédio não o
incomoda?
Não vejo problema. Ele só fica muito
pronunciado quando estou lançando um filme. É como uma avenida que registra
congestionamento uma vez por mês. No resto do tempo, o trânsito é ok.
Minha vida parece férias se comparada à de Brad Pitt. Quanto aos fãs, não
consigo ser grosseiro quando me pedem autógrafo. O que custa atender? Quando
estou com a família e não posso dar atenção, peço desculpas.
ISTOÉ –
O que o deixa estressado?
Não sei. Ter sido criado com irmãos
bagunceiros me tornou uma pessoa tranquila, mesmo quando em volta está um
caos.
ISTOÉ –
O que diria para as pessoas que
o definem como “bom demais para ser verdade”?
Hugh
Jackman –
Tenho vários defeitos. Um deles é não
saber consertar nada em casa. A única coisa boa é que estou sempre por perto
quando aparece um problema doméstico para resolver. Sou um péssimo faz-tudo. Só
sirvo para colocar o lixo para fora de casa.
ISTOÉ –
Na origem, os mutantes da série
“X-Men” (da qual Wolverine faz parte) eram uma referência às minorias. Acha que
continua atual?
Quando a história em quadrinhos foi
escrita, tratava-se de uma alegoria a Malcolm X e Martin Luther King e à forma
como eles abordavam o movimento pelos direitos civis. Numa leitura mais ampla,
a HQ trata das minorias e nos ensina a aceitar quem somos e a respeitar a
individualidade. Nela estaria a força de cada um, não a fraqueza.
ISTOÉ –
Isso explica por que a série é
tão cultuada entre o público adolescente?
Hugh
Jackman –
Acredito que sim. O adolescente sofre
em silêncio por ainda estar descobrindo quem é. Tenho um filho prestes a fazer
13 anos e vejo isso acontecer. Parte dele não quer ser diferente dos outros. No
mundo de hoje, ainda é duro ser um adolescente à procura de identidade,
especialmente se ele for homossexual ou pertencer a alguma outra minoria. Como
pai, eu me senti na responsabilidade de presentear meu filho com os quadrinhos
de “X-Men”.
ISTOÉ –
Foi falta de sorte concorrer ao
Oscar deste ano com Daniel Day-Lewis, protagonista de “Lincoln”?
Hugh
Jackman –
Antes da entrega, as pessoas
começaram a me dizer para não ficar chateado se perdesse. Confesso que não
entedia aonde queriam chegar. Para ser sincero, sempre pensei que minha relação
com o Oscar seria, no máximo, a de um mestre de cerimônias. Daniel é um dos
maiores atores de todos os tempos e concorrer com ele já foi uma vitória.
ISTOÉ –
É o que todos os indicados não
premiados costumam dizer.
Hugh
Jackman –
É um clichê, mas é pura verdade. Este
ano nós fomos premiados com um almoço no dia anterior à festa, algo que nunca
havia acontecido na história do prêmio. O presidente da Academia reuniu todos
os atores e atrizes indicados, tanto na categoria principal quanto na de
coadjuvante. Fomos todos à casa do ator Ed Begley Jr., que cozinhou para nós.
Foi surreal estar à mesa com Daniel Day-Lewis, Robert De Niro, Alan Arkin,
Tommy Lee Jones, Joaquin Phoenix e outros.
ISTOÉ –
Sobre o que conversaram?
Hugh
Jackman –
Foi um pouco estranho nos primeiros
dez minutos porque, curiosamente, ninguém se conhecia. Depois foi ótimo.
Passamos a jogar conversa fora. O ponto alto foi o discurso de Alan Arkin
dizendo que ele nunca entendeu a ideia de competição entre atores e que aquele
era um momento especial. Só o fato de estar naquele almoço já foi a realização
de um sonho.
ISTOÉ –
É verdade que foi Russell Crowe
quem impulsionou a sua carreira?
Hugh
Jackman –
Sim. Ele me ajudou muito no início.
Quando recusou o papel de Wolverine no primeiro filme dos X-Men, ele indicou o
meu nome ao diretor da série, Bryan Singer. Sem esse empurrãozinho certamente
não estaria aqui hoje.
por Elaine Guerini, de LondresEdição 17.07.2013 - nº 2278